A demissão não basta. É preciso extraditar.
A presidente Dilma agiu rápido, ao demitir o chanceler Antonio Patriota, após a surpreendente fuga de Roger Pinto Molina, com a ajuda de um diplomata brasileiro; a decisão, no entanto, não é suficiente para recolocar o Brasil no trilho da ordem internacional; será preciso também extraditar o boliviano, que responde a vinte processos na Bolívia, por corrupção e até por narcotráfico.
Perante a Justiça boliviana, um país com o qual o Brasil mantém relações diplomáticas, o senador Roger Pinto Molina tem diversas contas a acertar. É réu em cerca de vinte processos e responde a acusações de corrupção e até narcotráfico. Como diretor da Zona Franca de Cobija, foi acusado de desviar US$ 1,6 milhão, de acordo com um relatório de promotores bolivianos. Como governador do estado de Pando, foi também denunciado por corrupção.
Molina, que se diz um perseguido político, fugiu da Bolívia com a ajuda ilegal de um diplomata brasileiro, Eduardo Saboia, que desafiou a hierarquia do Itamaraty e feriu todas as normas internacionais – uma atitude que causou a demissão de seu chefe, o chanceler Antonio Patriota. A fuga contou ainda com o apoio do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, e de um misterioso empresário que emprestou um jatinho à dupla .
Diante da crise aberta pela "operação Argo" liderada pelo senador Ferraço, a presidente Dilma agiu rápido. Demitiu o chanceler Patriota, que se mostrou incapaz de vigiar seu próprio quintal e de monitorar uma situação delicada para as relações do Brasil com seus vizinhos sul-americanos.
No entanto, não é o bastante. A fuga de Molina, que não tinha salvo-conduto para deixar a embaixada brasileira em La Paz, causou indignação na Bolívia. "Na nota diplomática nós expressamos nossa profunda preocupação com a transgressão do princípio de reciprocidade e cortesia internacional. Por nenhum motivo o senhor Pinto poderia deixar o país sem o salvo-conduto", disse o chanceler boliviano David Choquehuanca. Segundo ele, é necessário ter uma explicação oficial do Brasil sobre o tema porque "foram violadas normas nacionais e internacionais”.
"O amparo da imunidade diplomática não pode transgredir normas nacionais e internacionais facilitando neste caso a fuga, a saída irregular do país do senador Pinto. Pode ser um precedente ruim (...) se é que nós, amparados pela imunidade diplomática, vamos permitir esses atos ilegais", prosseguiu o chanceler boliviano.
É evidente que se Pinto Molina fosse um senador norte-americano refugiado na embaixada brasileira em Washington para não responder a acusações de corrupção, o senador Ferraço e o diplomata Saboia não teriam tido a mesma coragem. Da mesma forma, é evidente que o australiano Julian Assange não sairá da embaixada equatoriana em Londres, se não tiver um salvo-conduto. Nem o presidente equatoriano Rafael Correa teria coragem para patrocinar a fuga do fundador do Wikileaks.
Diante da transgressão cometida pelo diplomata Saboia e pelo senador Ferraço, que ainda se julgou no direito de fazer juízos de valor sobre a diplomacia brasileira e suas relações com os vizinhos, só resta uma saída: extraditar o senador Roger Pinto Molina, que, aliás, parecia bem distante de um quadro de depressão nas primeiras entrevistas que concedeu no Brasil.
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